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A Alma e o Espírito
A Alma e o Espírito

A minha mãe havia acabado de falecer nas circunstâncias já suficientemente relatadas noutro sítio e telefonei à nossa então empregada a comunicar o facto, mas também para que ela comparecesse em nossa casa duas horas mais tarde a fim de escolher a indumentária para vestir o corpo para o funeral. Ela não quis (ingenuamente) acreditar, pois estivera no hospital ao início da tarde daquele dia.

Ao chegar à casa de Fátima onde habitávamos, dirigiu-se logo ao quarto. E ao contornar a cama da minha mãe ainda aberta desde há três dias, para aceder ao roupeiro, olhou para a cama vazia e desatou num tranquilo pranto acústico, sinceramente sentido. «Gulmira cale-se e escolha a roupa»! Mas ela prosseguiu mais alguns minutos... . Sim, a cabeça tonta da Gulmira, apesar de tudo, prestava-se ao sentimento. E a outras coisas boas mais. Dentre as infantilidades indesculpáveis... .


Ainda das últimas vezes em que a visitei, quando se falava na minha mãe, ela logo vestia os lábios de um sorriso doce – comoventemente doce.


A impressão daquele pranto foi tão forte, que ele ecoa em mim tempo fora, emudecido.

Porém algo permanece indestrutível: o espírito em missão, mais forte do que o mundo inteiro. Porque os outros, para resistirem à simples solidão, ou aos reveses, buscam-se e molham de choro as lapelas alheias. Nós refugiamo-nos na vastidão da nossa solidão construída... .

 

EV,

16 de dezembro de 2013.